quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

GONÇALO M. TAVARES


Hoje na Sábado também escrevo sobre O Reino, de Gonçalo M. Tavares (n. 1970). Entre os novos, ou seja, entre autores com menos de 50 anos, o autor distingue-se pela produção torrencial: somando romance, poesia, teatro e outro tipo de narrativas, algumas de natureza ensaísta, são 36 títulos em 16 anos. Agora, para assinalar o 10.º aniversário do fim da tetralogia O Reino, foram publicados em volume único os denominados romances: Um Homem: Klaus Klump / A Máquina de Joseph Walser / Jerusalém / Aprender a rezar na Era da Técnica. O mais recente, Aprender a rezar na Era da Técnica, foi o que suscitou maior empatia junto da crítica e do público. Dispensar preliminares e abrir com uma cena de sexo é um teaser infalível: «E o adolescente Lenz, determinado, avançou sobre a criadita.» Em adulto terá outra desenvoltura, como ilustrado na cena de sodomia (ou será apenas na posição de cachorro?). Como da primeira vez, o acto é presenciado: ali pelo pai, aqui por um vagabundo. Continuamos a falar de sexo. O resto é metafísica, mais ou menos germânica, área em que Tavares encontrou o seu nicho de eleição. Isso também o destaca da produção dominante. Quatro estrelas. Publicou a Caminho.

CESARINY


Hoje na Sábado escrevo sobre Poesia, volume de quase oitocentas páginas que colige a obra poética de Mário Cesariny (1923-2006). Coube a Perfecto E. Cuadrado o árduo trabalho de edição, conhecendo-se, como os leitores conheciam, as constantes rearrumações de poemas, mudanças de títulos e outros acertos caros aos poetas. Por exemplo, ficaram de fora, entre outros, Titânia (1953) e Um Auto para Jerusalém (1964), obras que terão edição autónoma. Num extenso prefácio, Cuadrado sublinha quanto «a sua obra poética é uma das mais ricas e complexas aportações para a história da poesia portuguesa contemporânea», que o mesmo é dizer, a súmula perfeita dos vários modos que o século XX fixou, sem esquecer o realismo ainda audível em Nobilíssima Visão, publicado em 1959, porém escrito entre 1945 e 46. Vigiado pela polícia do Estado Novo nos anos 1950 (a condição homossexual era tipificada como vagabundagem), avesso a toda a sorte de maneirismos, Cesariny foi sempre um outsider — «Sou um homem / um poeta / uma máquina de passar vidro colorido» —, alguém que teve de esperar pelos 82 anos para receber o seu primeiro e único prémio literário, meses antes de morrer, não tendo publicado nenhum livro desde O Virgem Negra, de 1989: «O Álvaro gosta muito de levar no cu / O Alberto nem por isso / O Ricardo dá-lhe mais para ir / O Fernando emociona-se e não consegue acabar.» Ou seja, Fernando Pessoa explicado às criancinhas. As várias secções de Pena Capital (1957) reúnem alguns dos poemas-fétiche do autor, tais como You Are Welcome to Elsinore, De Profundis Amamus, Autografia I, Outra Coisa, Being Beauteous e Exquisite Poem. Poemas da fase londrina que são hoje património da língua. Por não caber nas baias do surrealismo, Cesariny desmontou-o com alto grau de corrosão: «Este passo encontrado que nos guia entre as mesas / este chegar tão tarde às pontes levadiças / para uma exposição de rosas no nevoeiro / este eterno trabalho de dadores de sangue / é o que mais nos defende do massacre». O volume inclui a bibliografia do autor, cronologia biográfica e notas aos poemas. Cinco estrelas. Publicou a Assírio & Alvim.

terça-feira, 23 de janeiro de 2018

GERMANA TÂNGER 1920-2018


Com 98 anos, morreu ontem à noite Germana Tânger, epítome da diseuse passional. Professora do Conservatório Nacional durante 25 anos, titular da cátedra de Estudos Camonianos na Sorbonne, actriz bissexta, encenadora, mas, sobretudo, diseuse, Germana Tânger tornou-se célebre quando, em 1959, declamou na íntegra, e de cor, a Ode Marítima de Álvaro de Campos. (No Teatro da Trindade, em Lisboa, uma placa assinala os 40 anos desse espectáculo.) Viveu vários anos no Brasil, país onde o marido exerceu o cargo de adido cultural. Tendo toda a vida privado com os nomes mais destacados da cultura portuguesa, publicou em 2016 a sua autobiografia, Vidas Numa Vida. Figura mítica do Ancien Régime, a democracia não lhe regateou homenagens e comendas. Jorge Sampaio fez dela Grande Oficial da Ordem do Infante D. Henrique, as Câmaras de Lisboa e de Sintra atribuiram-lhe as respectivas medalhas de Mérito Cultural Grau Ouro, e a Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género distinguiu-a com o Prémio Maria Isabel Barreno, destinado a mulheres criadoras de Cultura. E a editora Assírio & Alvim, ainda no tempo de Manuel Hermínio Monteiro, dedicou-lhe um número especial d'A Phala.

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

CANDIDATURA


Passou despercebida a notícia de que a Academia Sueca pediu formalmente à Academia das Ciências de Lisboa a indicação de um candidato ao próximo Prémio Nobel da Literatura: «Em nome da Academia Sueca [...] temos a honra de vos convidar a nomear, por escrito, um candidato (ou candidatos) ao Prémio Nobel da Literatura para o ano de 2018.» O primeiro subscritor da carta, datada de Novembro, é Per Wästerberg, chairman do Comité Nobel.

Assim, no passado dia 11, os membros da Classe de Letras da Academia de Ciências de Lisboa indicaram os nomes de Manuel Alegre, o mais votado, e Agustina Bessa-Luís. Tirando o Expresso e a revista Sábado, não vi a notícia em mais lado nenhum.

Os candidatos ao Nobel não são propostos pela opinião pública, nem pelas redes sociais, nem pelos media, nem por associações e lobbies corporativos, nem por campanhas agressivas de marketing. São propostos por antigos laureados, por Academias nacionais ou instituições de prestígio irrefutável. E até pode não existir proposta e o Comité Nobel saber exactamente o que quer. O resto é ruído.

A VIDA COMO ELA É

O respeitinho é muito bonito. Começou hoje o julgamento da Operação Fizz, mas a sessão foi interrompida a pedido do MP, que queria, e conseguiu, dividir em dois o processo que alegadamente envolve o procurador Orlando Figueira e o antigo vice-Presidente de Angola, Manuel Vicente. Figueira responde já pelo alegado recebimento de 763 mil euros. Vicente mantém imunidade diplomática. Se era para chegar aqui, mais valia terem evitado o braço de ferro.

EM QUE FICAMOS?


Puigdemont chegou esta manhã (08:20 locais) a Copenhaga, onde vai proferir uma conferência. O Ministério Público espanhol pediu a reactivação da ordem europeia de detenção. Se isso acontecer, Puigdemont poderá ser preso a qualquer momento, na medida em que a legislação dinamarquesa, ao contrário da belga, não tem empecilhos processuais em matéria de extradição.

Entretanto, em Barcelona, Roger Torrent acaba de propor Puigdemont como candidato único à presidência da Generalitat. Dando de barato a aritmética (65 independentistas vs 65 constitucionalistas) e o exílio do candidato, a decisão de Torrent terá como provável consequência prolongar o estado de sítio na Catalunha.

domingo, 21 de janeiro de 2018

GROKO AVANÇA


Merkel pode respirar de alívio. Por 362 contra 279 votos (e uma abstenção), os delegados ao congresso do SPD realizado hoje em Bona mandataram Schulz para negociar formalmente a constituição do próximo Governo alemão. A menos que a votação directa dos 440 mil militantes do partido desautorizem o Congresso.

A Alemanha está sem Governo desde as eleições do passado 24 de Setembro, porquanto os 33% e 246 lugares da CDU/CSU são insuficientes para governar. O SPD teve o seu pior resultado (20%) desde 1945 justamente por ter governado coligado com Merkel. Mas, face a novas eleições que provavelmente fariam subir o score da extrema-direita, Schulz convenceu o partido. Se tudo correr bem, no fim de Março haverá Governo em Berlim.

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